Degustando a Vida

Degustando a Vida – Abril de 2011

Degustando a Vida - abril de 2011

Caros amigos leitores, É Páscoa e Vinho!!! Há mais de dois mil anos, quando Jesus Cristo consagrou o pão e o vinho , o destino do vinho foi selado até os dias de hoje. Na atualidade, a Ciência aponta inúmeros benefícios, como a possibilidade de reduzir o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e até mesmo câncer. Para a economia, no entanto, o vinho representa um delicioso negócio em expansão. Desde 2003, o consumo no Brasil cresce de 10 a 20% anualmente nesta época do ano.

Sabemos que na Semana Santa não devemos comer carne vermelha, damos lugar aos peixes e carnes brancas e o nosso famoso chocolate que podemos ou não harmonizar com vinho?

Sabemos que para o nosso famoso bacalhau podemos colocar tintos leves ou brancos que passem por madeira (brancos que são envelhecidos em carvalho, Chardonnay, alguns brancos portugueses e espanhóis), e dependendo do peixe sempre um branco cairá bem. Nas carnes brancas, podemos ficar com brancos e tintos leves. E nosso chocolate? Aqui o assunto é sério. Estamos falando de chocolates com alta porcentagem de cacau, que em última análise é o verdadeiro chocolate. Também não entraremos na retórica do casamento perfeito: Banyuls e Chocolate. Faz um bom tempo que em algumas ocasiões gosto de terminar certos vinhos tintos após a refeição com um pedaço de chocolate. Isso sempre me intrigou, já que chocolate está na relação dos mais típicos alimentos ardilosos, ou seja, aqueles que apresentam certa dificuldade de compatibilização com os vinhos. De fato, o chocolate comercial como conhecemos, normalmente é muito doce e muito gorduroso. Esses dois fatores dificultam o vinho sobretudo a gordura, que reveste a língua como uma película, atrapalhando a textura do vinho. Daí o sucesso do Banyuls com o chocolate. É um vinho fortificado à base de Grenache, com aromas potentes, doçura suficiente e taninos dóceis, discretos, que não desossam-se frente à uma textura viscosa.

Agora sim, aquele tinto seco, robusto e de personalidade que minha mulher adora com chocolate faz todo o sentido. A doçura do vinho não é mais necessária. Os taninos firmes do vinho tornam-se dóceis com o chocolate. A acidez do vinho dá as mãos com aquela sutil salinidade. O álcool do vinho abranda a forte adstringência e o amargor torna-o menos contundente. Quanto aos aromas, o chocolate sozinho lembra muito o toque de amêndoas torradas, que por sua vez vai casar perfeitamente com aromas empireumáticos e minerais do vinho, sobressaindo no final da harmonização toda a riqueza de frutas escuras de um tinto potente. Os vinhos mais indicados são tintos jovens, encorpados e estruturados com as uvas Cabernet Sauvignon, Shiraz ou Merlot. Toques amadeirados e eventualmente minerais são benvindos e dão complexidade ao conjunto. Do Novo Mundo, um potente Shiraz australiano é sempre lembrado, e do Velho Mundo, um Syrah do Rhône ou um Bordeaux concentrado (margem esquerda ou Pomerol).

À medida que vamos diminuindo a porcentagem de cacau (85%, 70%, ou um pouco menos), o açúcar e a gordura vão tomando espaço e por consequência, vamos abandonando os tintos secos. Nestes casos, uma das melhores harmonizações, segundo Philippe Bourguignon no seu famoso livro L´Accord Parfait, é um Porto Vintage relativamente vigoroso, com taninos, doçura e potência suficientes para encarar este desafio.

No caso de chocolates agregados a outros ingredientes, a semelhança de sabor dos mesmos com determinados vinhos fazem o elo de ligação. Frutas secas de um modo geral, irão combinar mais com Porto Tawny, Madeira ou Banyuls com ranço (traços de oxidação). Recheios de frutas cítricas casarão muito bem com Moscatéis, que inclusive enfrentam bem os chocolates mais doces. Já os recheados com frutas vermelhas ou passas vão bem com Porto no estilo ruby (com destaque para o LBV) ou o próprio Banyuls mais jovem. Por último, receitas das mais diversas que envolvem chocolate (tortas, bolos, mousses, entre outras), vão depender da forma e intensidade como ele é incorporado. Na maioria das vezes, suas típicas dificuldades de doçura e textura são sensivelmente minimizadas, ampliando sobremaneira os horizontes de compatibilização.

Um grande abraço,

Alex Passos (Sommelier).

www.alexpassos.com.br


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